Página Maria Granzoto
Editora de Literatura ArtCulturalBrasil
Arapongas - Paraná
Alminha
José Antonio Jacob
Desperto, mal lá fora o sol se aflora,
E, ainda zonzo de sono e de esperança,
Deixo pular pela janela afora
A minha inquieta alminha de criança.
Que alegre corre, rodopia e trança,
Entre a florada que a manhã decora
E feito folha solta vai embora,
Seguindo a brisa que na tarde avança.
Não se descuide minha alminha boa,
Que vai anoitecer, (a tarde é breve!)
O sol logo declina, o tempo voa!...
E, antes que o dia ao alto se deforme,
Ela retorna dócil, meiga, leve
E se acomoda no meu colo e dorme.
Introdução
O título
Primeiro quarteto
Desperto, mal lá fora o sol se aflora,
E, ainda zonzo de sono e de esperança,
Deixo pular pela janela afora
A minha inquieta alminha de criança.
Segundo quarteto
Que alegre corre, rodopia e trança,
Entre a florada que a manhã decora
E feito folha solta vai embora,
Seguindo a brisa que na tarde avança.
Primeiro terceto
Não se descuide minha alminha boa,
Que vai anoitecer, (a tarde é breve!)
O sol logo declina, o tempo voa!...
Último terceto
E, antes que o dia ao alto se deforme,
Ela retorna dócil, meiga, leve
E se acomoda no meu colo e dorme.
Conclusão
A sua, poeta Jacob, certamente é imensurável!
Bibliografia
Realização
artculturalbrasil@gmail.com
Usar dos adjetivos para as composições poéticas de José Antonio Jacob é, no mínimo, perda de tempo, além de nos tornarmos repetitivos, em que pese a riqueza vocabular da língua portuguesa.
O mesmo aplica-se à sua fonte inesgotável de inspiração e variáveis temáticas.
No entanto, este poema em especial, já partir do título, invade e permeia o nosso âmago de maneira indescritível. Cenários infinitos se nos apresentam, como num filme, se não considerarmos chula a comparação.
O título
“Alminha”! Quantas interpretações oferece ao leitor que lê e degusta a palavra... Alminha de anjinho de serena fragilidade. Quem sabe uma sutil referência à cacofonia de Camões em “Alma minha...”? Certamente não sentimos o tom jocoso neste diminutivo. O homem é o único animal que cria, que transforma, que evolui. Como ele evolui, a sua maneira de se comunicar com os outros homens também evolui. As palavras vão também evoluindo. Criam-se expressões novas, usam-se velhas expressões, mas com novas significações, modifica-se a grafia das palavras. Junções, reinvenções... Que o diga Guimarães Rosa!
Como a linguagem funciona por analogias (semelhança entre coisas diferentes) ela cria, interpreta e decifra significações.
É na linguagem que a significação se perfaz. Se o homem é a língua que fala é todo ele que se coloca na linguagem. As frases valem pela intenção do falante, pelo que ele quis destacar e realçar, pelo contexto da situação. (WALDECK, S. P. e SOUZA, Luís de)
A linguagem é conotativa, onde a pluralidade de sentido das coisas faz parte de sua própria existência
Saussure já dizia que a característica da fala é a liberdade de combinações.
Marilene Chauí diz em seu livro que a linguagem nasce das emoções, particularmente do grito (medo, surpresa, compaixão) e do riso (prazer, bem estar, felicidade). E mais adiante: Não é a fome ou a sede, mas o amor ou o ódio, a piedade, a cólera, que aos primeiros homens lhe arrancaram as primeiras vozes.
E é nesse momento de explosão que o homem utiliza os diminutivos para poder expressar melhor as suas emoções e as suas intenções de modo espontâneo, impulsivo e não apenas utilizá-lo como diminuição de tamanho.
Portanto, “Alminha “denota sentimentalismo, carinho ou cuidado com algo ou com a outra pessoa envolvida na comunicação.
Primeiro quarteto
Desperto, mal lá fora o sol se aflora,
E, ainda zonzo de sono e de esperança,
Deixo pular pela janela afora
A minha inquieta alminha de criança.
Meu Deus! Quanta magia na escolha dos vocábulos! Despertar tem uma conotação diferente de acordar. “mal lá fora”, significando nem bem. E o sol não nasce! Ele aflora! Emerge, brota tal qual uma plantinha. Transmite a idéia de ânimo, desentorpece! A vida existe! Que metáfora tão bem construída! E aí vem a antítese: eu não sou o sol que aflora porque acordo, porque estou estonteado, atordoado não só no aspecto físico, mas também no sentimental. Ah, essa esperança incerta! Então a alminha salta do ser e sai pululante em busca daquela sonhada esperança. Ë manhã de sol. É cedo, mas o céu está iluminado pelo sol. É possível ver a tudo e a todos!
Segundo quarteto
Que alegre corre, rodopia e trança,
Entre a florada que a manhã decora
E feito folha solta vai embora,
Seguindo a brisa que na tarde avança.
Quanta vivacidade e satisfação causa essa busca matinal em zigue-zague entre as flores que enfeitam o desejo, a expectativa desse encontro! Espalha-se a esmo embalado pela brisa que a tarde embala e envolve. A manhã já se foi. Agora veio a tarde. A alminha está na segunda etapa de sua busca.
Primeiro terceto
Não se descuide minha alminha boa,
Que vai anoitecer, (a tarde é breve!)
O sol logo declina, o tempo voa!...
Aqui fica clara a intencionalidade do poeta em dar um prolongamento à varredura da brisa e ao dar asas ao tempo: ao usar as reticências, uma vez que o segundo verso não é pontuado. A brisa não cessa de fazer sua ação, ela a continua – empurra o sol... Intrinsicamente, a volta para casa deverá ocorrer. Por isso é preciso estar atento, pois a escuridão se aproxima. E a terceira etapa será noite e não combina com o tão sonhado encontro. Quanta polissemia semântica contida nos parênteses e nesse ponto de exclamação! Algemas que fecham a passagem, o ir além do pretendido.
Último terceto
E, antes que o dia ao alto se deforme,
Ela retorna dócil, meiga, leve
E se acomoda no meu colo e dorme.
E então fecha-se o ciclo com a chegada do ocaso. A noite virá, rápida. É a terceira e última etapa. Mas a esperança ainda não encontrada traz a docilidade e reforça que o embate deverá continuar. É necessário acreditar, renovar as energias, adormecendo. Enquanto houver vida, enquanto houver dia de sol, a esperança poderá ser encontrada.
Conclusão
Do belo poema fica um dos significados da existência humana: o sonho, a esperança de ser uma “alminha” que enfrenta as fatalidades que se lhe aparecem. O revés é possível porque a esperança é o nutriente. E ela não se encontra nas falsas ilusões que tantas vezes criamos para fugir da dor. Não se encontra nos caminhos de tentações que escolhemos apenas para satisfazer nossos prazeres mundanos.
A esperança não se encontra nos castelos de areia que construímos para esconder o nosso medo.A esperança não se encontra nas idéias que nos levam a crer que a vida termina com o cessar dos fluidos vitais do nosso físico. A esperança não está no tamanho das nossas pretensões. Ela é a “alminha” que tem a infância, a juventude e até mesmo a velhice para ser encontrada porque a manhã existe, a tarde existe e a noite existe. Qual será o tamanho da nossa alma?
A sua, poeta Jacob, certamente é imensurável!
Bibliografia
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Realização
artculturalbrasil@gmail.com
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