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UMA CIDADE SEM MEMÓRIA CULTURAL É UMA CIDADE SEM FUTURO HISTÓRICO

Patativa do Assaré


Assaré - CE - 1909 - 2002
Introdução
Patativa é o nome de um pássaro de canto enternecedor que habita as caatingas e matas do Nordeste brasileiro. Possui penas plúmbeas, as asas e cauda pretas O canto da Patativa, melodioso e triste, é tão atraente que o nome deste pássaro virou apelido de alguns cantores nordestinos. Devido a ele a Patativa já foi citada em uma música famosa de Vicente Celestino, no romance "Ubirajara", de José de Alencar, e no poema "As primaveras", de Casimiro de Abreu.



O centenário aniversariante


Antônio Gonçalves da Silva, poeta e cantor, conhecido em todo o Brasil como Patativa do Assaré, referência ao município que nasceu. Veio ao mundo no dia 9 de março de 1909. Filho do agricultor Pedro Gonçalves da Silva e de Maria Pereira da Silva. Criado num ambiente de roça, na Serra de Santana, próximo a Assaré , seu pai morrera quando tinha apenas oito anos, legando aos seus filhos Antônio, José, Pedro, Joaquim, e Maria o ofício da enxada, "arrastar cobra pros pés" , como se diz no sertão. A sua vocação de poeta, cantador da existência e cronista das mazelas do mundo despertou cedo. Aos cinco anos já exercitava seu versejar. A mesma infância que lhe testemunhou os primeiros versos presenciaria a perda da visão direita, em decorrência de uma doença, segundo ele, chamada "mal d'olhos". Se a mãe ainda o acompanhou por longos anos, o pai faleceu quando o poeta ainda tinha oito anos de idade. É da figura paterna que Patativa reservou na memória a voz cantada. Dividia o trabalho na roça com brincadeiras nos galhos das árvores e ouvia histórias dos mais velhos.
Batizaram-no poeta Analfabeto "sem saber as letra onde mora", como diz num de seus poemas; sua projeção em todo o Brasil se iniciou na década de 50, a partir da regravação de "Triste Partida", toada de retirante gravada por Luiz Gonzaga.
Sua verve poética serviu para denunciar injustiças sociais, propagando sempre a consciência e a perseverança do povo nordestino que sobrevive e dá sinais de bravura ao resistir às condições climáticas e políticas desfavoráveis. A esse fato se refere à estrofe da música Cabra da Peste:
"Eu sou de uma terra que o povo padeceMas não esmorece e procura vencer.Da terra querida, que a linda caboclaDe riso na boca zomba no sofrêNão nego meu sangue, não nego meu nome.Olho para a fome , pergunto: que há ?Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,Sou cabra da Peste, sou do Ceará."
Embora tivesse facilidade para fazer versos desde menino, a Patativa do município de Assaré, no Vale do Cariri, nunca quis ganhar a vida pelo seu dom de poeta. Mesmo tendo feito shows pelo Sul do país, quando foi mostrado ao grande público por Fagner em finais da década de 70, sempre se considerou o mesmo camponês humilde e habitante no mesmo torrão natal onde nasceu, no seu pedaço de terra na Serra de Santana.
Seus livros foram publicados ocasionalmente por pesquisadores e músicos amigos e parceria com pequenos selos tipográficos e hoje são relíquias para os colecionadores da literatura nordestina.

Nos dias em que voltava da escola, a menina Isabel Cristina já sabia que tinha um encontro marcado com seu avô, ao chegar a casa. O poeta Patativa do Assaré solicitava à neta um dedo de prosa. Seja para perguntar sobre o desempenho escolar dela ou para pedir que a menina lesse uma poesia que admirava. ''Meu avô também adorava conversar e contar histórias: queria saber sobre minhas notas e sempre pedia para ler alguma coisa. Cheguei a ler quatro vezes para ele “A Saga de Luiz Gonzaga'', lembra Isabel Cristina, agora com 33 anos, e coordenadora da Fundação Memorial Patativa do Assaré, que conserva documentos, objetos pessoais, pesquisas e outros materiais que fizeram parte da vida e da obra do poeta.
O compartilhamento de experiências com a família era apenas uma das facetas de Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, que completaria em março, 100 anos, se não tivesse partido em oito de julho de 2002. Quem o conheceu de perto, guarda boas recordações. Isabel Cristina afirma que seu avô costumava dar conselhos aos netos. ''Ele pedia que a gente preservasse as amizades. Para ele, o que era mais importante era ser humilde e valorizar os amigos''. Isabel era tão próxima a Patativa, que o ajudava a datilografar correspondências e poesias, como as do livro Aqui Tem Coisa, lançado em 1994, na I Feira Brasileira do Livro de Fortaleza. ''Todas as cartas que chegavam, eu lia para ele, que tinha a preocupação de dar um retorno. Então, ele ditava o que queria responder e eu datilografava''.
Aos 16 anos, Patativa vende uma ovelha para comprar a primeira viola. Do seu cotidiano e do contato com a natureza, conseguia extrair a inspiração para seus versos. Aos poucos, conquistou Assaré, o Brasil e o mundo, com suas rimas e seu canto. Como todo bom avô, gostava de incentivar os filhos e os netos a perpetuar sua habilidade: a arte de fazer poesia. ''Ele adorava dizer que, se a gente tentasse, conseguia. Mas eu nunca tive esse dom. Mas tem uma neta dele, a Antônia Cidrão, que acabou se tornando poeta'', comenta Isabel.
Poeta que ''conseguiu alcançar todas as classes sociais'‘, 'a voz de Patativa era contra o desprezo, a indiferença e o preconceito. Suas poesias são ricas em metáforas e apresentam uma beleza que nos conforta. Ele buscava a igualdade social. A poesia de Patativa será lembrada por lutar contra a exploração do maior pelo menor''.
Patativa do Assaré (1909 - 2002) faria 100 anos no próximo dia 5 de março. Mas as homenagens pelo centenário do maior poeta popular cearense acontecem ao longo de todo o ano de 2009, com progamação bastante diversificada. Segue abaixo um seu poema que trata da linguagem pelo olhar: a comunicação não-verbal, que representa para a maioria das pessoas um grande desafio. Esta forma de comunicação universal esta cada vez mais esquecida no mundo moderno. No primeiro momento fica muito difícil olhar, quem quer que seja nos olhos, por várias razões, entre elas, pela educação, repressões, religião e muito mais, sendo que cada pessoa tem a sua própria história de vida, alem de que o olhar é extremamente revelador, sob todos os aspectos, sendo muito difícil disfarçar um sentimento encarando alguém olho no olho.Jean Paul Sartre sugeriu, certa vez, que o contato visual é que nos faz real e diretamente consciente da presença de outro ser humano dotado de consciência e intenções próprias. Quando os olhos se encontram, nota-se um tipo especial de entendimento de ser humano a ser humano.
O comportamento ocular é talvez a forma mais sutil da linguagem física. A cultura nos programa desde pequenos, ensinando-nos o que fazer com os olhos e o que esperar do próximo. Como resultado disso, quando alguém muda a direção do olhar e encontra ou não resposta de outrem, o efeito produzido é inteiramente desproporcional ao esforço muscular realizado. Mesmo quando o contato é efêmero, como geralmente é a soma do tempo dedicado a olhar a outra pessoa sempre transmite alguma coisa. O movimento dos olhos, é lógico, indica aquilo que uma pessoa está vendo. Estudos sobre comunicação demonstram um fato inesperado, segundo o qual esses movimentos também regulam a conversa. Durante a troca diária de palavras, enquanto se presta atenção àquilo que estão dizendo, o movimento dos olhos proporciona um sistema de sinalização, que indica ao interlocutor quando é sua vez de falar. Assim os olhos podem transmitir atitudes e sentimentos, os movimentos oculares podem também expressar a personalidade. Uns olham mais que os outros. Aqueles que, por natureza, são mais carinhosos, são capazes de olhar muito, do mesmo modo como aqueles que, segundo os psicólogos, sentem mais necessidade de afeto. Denominada também "motivação de amor", a necessidade de carinho é o desejo de se alcançar um relacionamento gostoso, afetivo e íntimo com as outras pessoas, necessidade que todos sentimos em maior ou menor grau.
Este tema foi desenvolvido baseado em: 1."A Comunicação Não-Verbal" Flora Davis Summus Editorial Ltda.2."Você" Desmond Morris Ed. Círculo do Livro S.A.


...
Linguage dos óio
Quem repara o corpo humano
E com coidado nalisa,
Vê que o Autô Soberano
Lhe deu tudo o que precisa,
Os orgo que a gente tem
Tudo serve munto bem,
Mas ninguém pode negá
Que o Auto da Criação
Fez com maior prefeição
Os orgo visioná.

Os óio além de chorá,
É quem vê a nossa estrada
Mode o corpo se livrá
De queda e barruada
E além de chorá e de vê
Prumode nos defendê,
Tem mais um grande mistér
De admirave vantage,
Na sua muda linguage
Diz quando qué ou não qué.

Os óios consigo tem
Incomparave segredo,
Tem o oiá querendo bem
E o oiá sentindo medo,
A pessoa apaixonada
Não precisa dizê nada,
Não precisa utilizá
A língua que tem na bôca,
O oiá de uma caboca
Diz quando qué namorá.

Munta comunicação
Os óio veve fazendo
Por izempro, oiá pidão
Dá siná que tá querendo
Tudo apresenta na vista,
Comparo com o truquista
Trabaiando bem ativo
Dexando o povo enganado,
Os óios pissui dois lado,
Positivo e negativo.

Mesmo sem nada falá,
Mesmo assim calado e mudo,
Os orgo visioná
Sabe dá siná de tudo,
Quando fica namorado
Pela moça despresado
Não precisa conversá,
Logo ele tá entendendo
Os óios dela dizendo,
Viva lá que eu vivo cá.

Os óios conversa munto
Nele um grande livro inziste
Todo repreto de assunto,
Por izempro o oiá triste
Com certeza tá contando
Que seu dono tá passando
Um sofrimento sem fim,
E o oiá desconfiado
Diz que o seu dono é curpado
Fez arguma coisa ruim.

Os óis duma pessoa
Pode bem sê comparado
Com as água da lagoa
Quando o vento tá parado,
Mas porém no mesmo istante
Pode ficá revortante
Querendo desafiá,
Infuricido e valente;
Neste dois malandro a gente
Nunca pode confiá.

Oiá puro, manso e terno,
Protetó e cheio de brio
É o doce oiá materno
Pedindo para o seu fio
Saúde e felicidade
Este oiá de piedade
De perdão e de ternura
Diz que preza, que ama e estima
É os óio que se aproxima
Dos óio da Virge Pura.

Nem mesmo os grande oculista,
Os dotô que munta estuda,
Os mais maió cientista,
Conhece a lingua muda
Dos orgo visioná
E os mais ruim de decifrá
De todos que eu tô falando,
É quando o oiá é zanoio,
Ninguém sabe cada óio
Pra onde tá reparando.

...


O Peixe


Tendo por berço o lago cristalino,
Folga o peixe, a nadar todo inocente,
Medo ou receio do porvir não sente,
Pois vive incauto do fatal destino.

Se na ponta de um fio longo e fino
A isca avista, ferra-a insconsciente,
Ficando o pobre peixe de repente,
Preso ao anzol do pescador ladino.

O camponês, também, do nosso Estado,
Ante a campanha eleitoral, coitado!
Daquele peixe tem a mesma sorte.

Antes do pleito, festa, riso e gosto,
Depois do pleito, imposto e mais imposto.
Pobre matuto do sertão do Norte!

Publicou diversos livros e recebeu vários prêmios e homenagens.

Bibliografia

 O Poeta do Povo. Vida e Obra do Patativa do Assaré, - livro com CD encartado com poemas recitados por ele e entrevistas (1999)
ANDRADE, Cláudio Henrique Sales. Patativa do Assaré: as razões da emoção (capítulos de uma poética sertaneja). Fortaleza. Editora UFC / São Paulo : Nakin Editoral, 2003.
CARVALHO, Gilmar de. Patativa do Assaré. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2000
FIGUEIREDO, José Alves de. Patativa do Assaré. Fortaleza: 1970.
NUVENS, Plácido Cidade. Patativa e o Universo Fascinante do Sertão. Fortaleza: Fundação Edson Queiroz, 1995.
SILVA, Antônio Gonçalves da. Patativa do Assaré. In: Patativa do Assaré uma voz do Nordeste. Introdução e seleção Sylvie Debes. São Paulo : Hedra, 2000. (Biblioteca de Cordel)
ASSARÉ, Patativa do. Ispinho e Fulo. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1990.


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Contato: granzoto@globo.com

Realização


3 comentários:

  1. Anônimo21:27

    Parabéns responsáveis por este Blog ArtculturalBrasil. Parabéns Maria Granzoto da Silva pelas brilhantes matérias até aqui apresentadas. Melhor fonte de pesquisa e consulta da internet!!!

    Jerônimo Josué

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  2. Parabéns a todos pelo sucesso do blog ArtculturalBrasil, um cantinho onde podemos
    encontrar os mestres da poesia...
    Abraços
    Naidaterra

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  3. Parabéns pela criação deste espaço cultural, onde a poesia popular também faz morada.
    Abraço,
    Dalinha Catunda

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