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UMA CIDADE SEM MEMÓRIA CULTURAL É UMA CIDADE SEM FUTURO HISTÓRICO

Condoreirismo 1

Página Maria Granzoto
Editora de Literatura Brasileira ArtCulturalBrasil
Arapongas - Paraná

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Condoreirismo – Parte I

O nome da corrente, condoreirismo, associa-se ao condor ou outras aves, como a águia, o falcão e o albatroz, que foram tomadas como símbolo dessa geração de poetas com preocupações sociais. Identificando-se com o condor, ave de vôo alto e solitário, com capacidade de enxergar a grande distância, os poetas condoreiros supunham ser eles também dotados dessa capacidade e, por isso, tinham o compromisso, como poetas-gênios iluminados por Deus, de orientar os homens comuns para os caminhos da justiça e da liberdade.

Não poderíamos abordar a temática do condoreirismo sem mencionar Victor Hugo, poeta francês que encontrou no Brasil, como Castro Alves, Pedro Luís, Pedro Calasãs e Sousândrade.


Filho de Joseph Hugo e de Sophie Trébuchet, nasceu em Besançon, no Doubs, mas passou a infância em Paris. Estadas em Nápoles e na Espanha acabaram por influenciar profundamente sua obra. Funda com os seus irmãos em 1819 uma revista, o Conservateur littéraire (Conservador literário), que já chama a atenção para o seu talento. No mesmo ano, ganha o concurso da Académie des Jeux Floraux.

O seu primeiro recolhimento de poemas, Odes, é publicado em 1822: tem então vinte anos.

Com Cromwell, publicado em 1827, alcança o sucesso. No prefácio deste drama em versos, que não foi encenado enquanto esteve vivo, opõe-se às convenções clássicas, em especial à unidade de tempo e à unidade de lugar.

Tem, até uma idade avançada, diversas amantes, sendo a mais famosa Juliette Drouet, atriz sem talento que lhe dedica a sua vida, e a quem ele escreve numerosos poemas. Ambos passavam juntos o aniversário do seu encontro e preenchiam, nesta ocasião, ano após ano, um caderno comum que nomeavam o Livro do aniversário.

Alugava apartamentos nos arredores de Paris com nomes falsos, onde encontrava-se com suas amantes. Numa dessas ocasiões foi flagrado com Léonie Briard, cujo o marido havia chamado a polícia, a mulher foi presa, quanto a Victor Hugo nada ocorreu-lhe.


Criado por sua mãe no espírito da monarquia, acaba por se convencer, pouco a pouco, do interesse da democracia ("Cresci", escreve num poema onde se justifica). A sua ideia é que "onde o conhecimento está apenas num homem, a monarquia se impõe." "Onde está num grupo de homens, deve fazer lugar à aristocracia. E quando todos têm acesso às luzes do saber, então vem o tempo da democracia".

Tendo se tornado favorável a uma democracia liberal e humanitária, é eleito deputado da Segunda República em 1848, e apoia a candidatura do príncipe Louis-Napoléon.


Exila-se após o golpe de Estado de 2 de Dezembro de 1851, que condena vigorosamente por razões morais em "Histoire d'un crime".

Durante o Segundo Império, em oposição a Napoléon III, vive em exílio em Jersey, Guernsey e Bruxelas. É um dos únicos proscritos a recusar a anistia decidida algum tempo depois: « Et s'il n'en reste qu'un, je serai celui-là » ("e se sobra apenas um, serei eu").

Com a morte da sua filha, Leopoldina, começa a descobrir e investigar experiências espíritas relatadas numa obra diferente nomeada "Les tables tournantes de Jersey".

De acordo com seu último desejo, seu corpo é depositado em um caixão humilde que é enterrado no Panthéon.

Tendo ficado vários dias exposto sob o Arco do Triunfo, estima-se que 1 milhão de pessoas vieram lhe prestar uma última homenagem. Quando morreu as prostitutas de Paris ficaram de luto.
 
Pensamento Político
 
A partir de 1849, Victor Hugo dedica um quarto da sua obra à política, um quarto à religião e outro à Filosofia humana e social. Se o pensamento de Victor Hugo pode parecer complexo e às vezes contraditório, não se pode dizer que seja monoteísta.

Sempre um reformista, envolve-se em política por toda a sua vida. Mas se critica as misérias sociais, não adota o discurso socialista da luta de classes. Pelo contrário, ele próprio viveu uma vida financeiramente confortável, construída com seus próprios esforços, tornando-se um dos escritores mais bem remunerados de sua época. Acreditava no direito do homem usufruir dos frutos do seu trabalho, embora reforçasse a responsabilidade que acompanha o enriquecimento pessoal. Desse modo, sempre buscou prosperar enquanto doava uma parte significativa de sua renda para diferentes obras de caridades.

Seu principal romance, os Miseráveis, narra a história de um self made-man, Jean Valjean, um sujeito que foge da prisão e reconstrói sua vida através do trabalho. Valjean monta uma empresa e, através dela, traz prosperidade para a sua região; além disso, usa sua fortuna em obras de caridade para ajudar os pobres. Suas boas obras são interrompidas apenas quando um policial - um agente do Estado - decide interferir arbitrariamente nas atividades privadas da sociedade civil.

Os Miseráveis, portanto, traz claramente a filosofia política de Victor Hugo. É um mundo onde há cooperação - e não luta - entre as classes; onde o empreendedor desempenha um função essencialmente benéfica para todos; onde o trabalho é a via principal de aprimoramente pessoal e social; onde a intervenção estatal por motivos moralista - seja do policial ou do revolucionário obcecado pela justiça terrena - é um dos principais riscos para o bem de todos que será gerado espontaneamente pelos indivíduos privados.

Ele também se opõe à violência quando ela se aplica contra um poder democrático, mas a justifica (conforme à Declaração dos direitos do homem) contra um poder ilegítimo. É assim que, em 1851, lança um chamado à luta - "carregar seu fuzil e ficar preparado" - que não é seguido. Mantém esta posição até 1870, quando começa a Guerra Franco-Prussiana; Hugo a condena: "guerra de capricho" e não de liberdade.

Em seguida, o império é deposto e a guerra continua, desta vez contra a república; o argumento de Hugo em favor da fraternização resta, ainda, sem resposta. É assim que, em 17 de Setembro, publica uma chamada ao levantamento de massa e à resistência. Os republicanos moderados ficam horrorizados: preferem Bismarck aos "socialistas"! A população de Paris, no entanto, se mobiliza e lê avidamente Les Châtiments. (Ver Comuna de Paris).

Coerente, Hugo não podia ser comunista: "O significado da Comuna é imenso, ela poderia fazer grandes coisas, mas na verdade faz somente pequenas coisas. E pequenas coisas que são odiosas, é lamentável. Compreendam-me: sou um homem de revolução. Aceito, assim, as grandes necessidades, mas somente sob uma condição: que sejam a confirmação dos princípios e não o seu desrespeito. Todo o meu pensamento oscila entre dois pólos: civilização-revolução "." A construção de uma sociedade igualitária só será possível se for conseqüência de uma recomposição da sociedade liberal."

No entanto, diante da repressão que se abate sobre os comunistas, o poeta declara seu desgosto: "Alguns bandidos mataram 64 reféns. Replica-se matando 6000 prisioneiros!".

Denunciando até o fim a segregação social, Hugo declara durante a última reunião pública que preside: "A questão social perdura. Ela é terrível, mas é simples: é a questão dos que têm e dos que não têm!". Tratava-se precisamente de recolher fundos para permitir a 126 delegados operários a viagem ao primeiro Congresso socialista da França, em Marselha.

Victor Hugo, no entanto, nunca aceitou o discurso socialista. Ele acreditava que uma sociedade aberta encontraria soluções para seus problemas. Mais que isso, ele era contra políticas de redistribuição de riquezas, pois o efeito dessas seria desincentivar a produção, fazendo com que toda a sociedade caminhasse para trás. Caso fosse permitida a liberdade de comércio, por outro lado, e caso se tolerasse algum grau de desigualdade social, o resultado - largamente comprovado pela história posterior - seria o progresso geral de todos, beneficiando inclusive os membros mais pobres da sociedade. Portanto, a defesa de um ordem que permita o progresso é benéfica para todos, e não para uma classe específica.

"O comunismo e o agrarianismo acreditam que resolveram este segundo problema [da distribuição de renda], mas estão enganados: a distribuição destrói a produtividade. A repartição em partes iguais mata a ambição e, por conseqüência, o trabalho. É uma distribuição de açogueiros, que mata aquilo que reparte. Portanto, é impossível tomar essas pretensas soluções como princípio. Destruir riqueza não é distribuí-la".

“Está pois a pena de morte abolida nesse nobre Portugal, pequeno povo que tem uma grande história. (…) Felicito a vossa nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Desfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à guerra! Viva a vida! Ódio ao ódio. A liberdade é uma cidade imensa da qual todos somos concidadãos”

— Victor Hugo, 1876, a propósito da abolição da pena de morte em Portugal (o primeiro país europeu a fazê-lo).

Victor Hugo e o Brasil

As relações entre Victor Hugo e o Brasil foram dissimétricas. Se por um lado o poeta francês irradiou seu brilho sobre a cultura brasileira no século XIX, por outro o Brasil não é muito presente na obra de Hugo, onde vai aparecer de forma tardia.

Porém o escritor não ignorou totalmente um país do qual ele ouviu falar através de Charles Ribeyrolles, companheiro de exílio em Jersey e autor, em 1859, de um Brazil pittoresco. Uma das primeiras referências àquelas terras distantes se encontra na coletânea Chansons des rues et des bois, de 1865. Nesse volume há um conjunto de 21 textos, intitulado « L’éternel petit roman », que faz o relato de um amor passageiro, das primeiras turbações do coração até o esquecimento final. Sobretudo oito poemas, nesse conjunto, evocam uma certa Rosita Rosa — nome atrás do qual se esconderia uma conquista do autor — vinda de « ce Brésil/ si doré qu’il fait du reste/ de l’univers un exil » (Gare !). Descobre-se, um ano mais tarde, uma breve alusão às « dames brésiliennes » de « Rio-Janeiro » em Les Travailleurs de la mer. Enfim em 1884, um ano antes de sua morte, Hugo vai se regozijar com a abolição da escravatura no estado do Ceará, em um discurso lido durante um banquete presidido por Victor Schoelcher. Um ano antes, ele teria redigido um poema celebrando « le vaste Brésil aux arbres semés d’or », que será publicado apenas em 27 de fevereiro de 1902 no Jornal do Brasil — mas esta atribuição não é garantida.

Essas poucas marcas na obra hugoliana ou hugoana não dão conta da influência do poeta na vida cultural do Brasil durante o século XIX. Desde os anos 1830 seus textos são publicados, traduzidos e discutidos no seio das elites intelectuais. No Rio, o Jornal do Commercio publica alguns dos seus romances em folhetim. Os escritores brasileiros se reconhecem na veemência de Victor Hugo, em sua retórica apaixonada, suas imagens fortes, suas antíteses vigorosas e em seu ritmo característico. Encontramos estes impulsos poéticos e este fôlego épico nos românticos, principalmente nos que se agruparam em torno do Condoreirismo, movimento cujo símbolo é o condor, pássaro majestoso que voa alto e vê longe. Estes autores aderem à visão hugoana da História, a sua mística do Povo e sobretudo ao papel messiânico do Poeta, porta-voz e mesmo guia da Nação rumo ao Progresso, à Justiça e à Liberdade. Na metade do século, a influência de Victor Hugo é onipresente na literatura: epígrafes, citações, traduções. É o poeta Gonçalves Dias, por exemplo, que traduz Bug-Jargal, ou ainda o romancista Machado de Assis que se encarrega de Travailleurs de la mer. A tal ponto que se pode falar de “hugoanismo” para caracterizar estas múltiplas manifestações. Sua fama até mesmo ultrapassa os limites da literatura: uma era, Maria Tudor, é composta por Carlos Gomes entre 1874 e 1878. O mais emblemático destes turibulários é Castro Alves, cantor ardente da liberdade, a quem se acusou de ser mais “hugólatra” que brasileiro, às vezes no limite do plágio (cf. suas Palavras de um conservador).

Nos românticos o combate literário se confundia com o combate político e social. Paris representava então para os brasileiros um lugar utópico onde se vivia os ideais da Revolução Francesa, da qual Victor Hugo, após seu engajamento e, depois, seu exílio político, era o profeta. É significativo que os livros mais reeditados nesta época tenham sido Les Châtiments, Histoire d’un crime et Napoléon le Petit. A luta dos artistas pela república e contra a escravidão estava em sintonia com os escritos de Hugo. O próprio imperador do Brasil, Dom Pedro II, cujos ideais esclarecidos se chocavam com os interesses dos proprietários de escravos, fez questão de render homenagem a Hugo quando de sua passagem por Paris em 1877 (ver « Visite au poète français »).

A fascinação brasileira foi particularmente visível na morte do escritor. Porém, mais que o poeta ou o dramaturgo, os brasileiros saudaram o arauto da liberdade que foi, para eles, Hugo. Nesta ocasião o jornalista Múcio Teixeira publicou Hugonianas, uma compilação de homenagem retomando 107 poemas de Victor Hugo traduzidos por alguns dos maiores escritores daquela época (Castro Alves, Gonçalves Dias, Casimiro de Abreu, Vicente de Carvalho, Artur Azevedo, etc.). Mas esta fermata foi também o canto do cisne da influência hugoana. Uma vez a escravidão abolida e a república proclamada, a modernidade se situava do lado da corrente realista. E pouco a pouco a atração por Hugo declinou.

Nos dias atuais, como dá provas, por exemplo, o Simpósio Internacional Victor Hugo que aconteceu em Belo Horizonte, o autor francês — cuja notoriedade junto a audiência popular é regularmente reavivada por meio de novas adaptações — permanece, para o público culto brasileiro, uma figura de referência do pensamento humanista.

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SILVA, Vitor Manuel de Aguiar e. Teoria da Literatura. São Paulo: Martins Fontes, 1976.
Amós Coelho da Silva (UERJ e UGF)


Condoreirismo 2
Condoreirismo 3

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2 comentários:

  1. Anônimo15:49

    muito bom amigos

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  2. thannypaz@live.com16:24

    muito bom .....afinal de contas sempre estaremos aprendendo...

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